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As alterações na LINDB e as consequências positivas da sua aplicação.

Texto por Maria Eugênia Del Nero Poletti.

 

A Lei. n. 13.655/18, que incluiu na LINDB (Lei de Introdução às normas do direito brasileiro) (Dec-lei nº 4.657/42) importantes  parâmetros interpretativos em matéria de direito público, envolve claramente uma nova concepção de como pensar o direito público e o Estado.

De modo geral, as introduções legislativas realizadas pela nova lei determinam, antes de tudo, maior responsabilidade ao Estado, estabelecendo e determinando que este aja de modo coerente, com indicação expressa dos motivos de fato e de direito que o levaram a decidir daquela forma, bem como as razões pelas quais não são cabíveis alternativas na sua decisão[1].

A indicação do legislador nos parece clara: as decisões proferidas pelo Estado, seja em que esfera for, hão de considerar as consequências práticas a bens e direitos alheios, tudo pela própria ideia de direito.

A introdução do parâmetro “consequência prática” para fundamentar as decisões proferidas pelo Estado – seja no âmbito da Administração, seja pelos órgãos controladores, seja como Estado judicante -, implica imposição de um conceito da legalidade através de uma nova mutação interpretativa.

Assim, além dos princípios – implícitos e explícitos – e das normas, deve-se levar em consideração as consequências daquela decisão do Estado, com o propósito de legitimar o direito, ampliando-se a legalidade, configurando-a em juridicidade em sentido amplo, cujos fundamentos advêm dos princípios da moralidade, segurança jurídica e proporcionalidade, dentre outros.

A crítica à lei, feita por alguns doutrinadores, refere-se à proibição estipulada  de se decidir com base em “valores jurídicos abstratos”, porque num primeiro passar de olhos pode dar a impressão de que há uma oposição à força normativa dos princípios.

Preferimos não entender assim. A norma veio para exigir que se coadune a essência dos princípios com a consideração das consequências reais daquela decisão, visando tornar a decisão mais efetiva e palatável, combatendo, inclusive a grande insegurança jurídica que paira no país.

O Estado, por exemplo, na sua feição de agente regulador – quando institui as autarquias sob regime especial (Agências Reguladoras), transmuta-se para um Estado mais autônomo e eficaz, apto a transmitir confiança àquele determinado setor – terá que respaldar suas decisões sob a ótica das consequências práticas de suas determinações, sob pena de ofensa à nova lei.

O alargamento da função regulatória do Estado, com a instituição das Agências Reguladoras, e agora sob os parâmetros da nova lei, aproxima mais o Estado da juridicidade e da segurança jurídica, amparadas, obviamente, em seus próprios princípios democráticos.

De acordo com a nova lei, por exemplo, na invalidação de atos, contratos ou processos administrativos há de ser definido se serão ou não preservados os efeitos do contrato ou quaisquer situações juridicamente constituídas, devendo ser feita  sempre uma contextualização prática necessária, não podendo haver imposição, segundo texto da lei, aos sujeitos atingidos ônus ou perdas que, em função das peculiaridades do caso, sejam anormais ou excessivos (parágrafo único, do art. 20).

A novel lei, aplicada a todos os ramos do direito, determina expressamente normas sobre a segurança e eficiência na aplicação do direito público visando minimizar decisões que gerem insegurança jurídica já que, infelizmente, muitas das decisões são impregnadas de subjetivismos e pessoalidades.

A lei, portanto, atinge todos os Poderes Públicos indistintamente, indicando que a proteção à boa-fé na seara pública – ainda que seja certa sua origem civilista – invoca o Estado a agir de forma razoável e proporcional, contextualizando – sem perder de vista a legalidade – as consequências de suas decisões.

Atrelado a tais ideias, a lei também faz referência à responsabilidade dos administradores públicos, impondo a eles que deverão ser consideradas as dificuldades reais do gestor, com as circunstâncias práticas que houverem imposto, limitado ou condicionado a ação do agente; e no caso de aplicação de sanção ao agente terá que se levar em conta a dosimetria aplicada quando relativa ao mesmo fato.

Gera a lei condicionantes para a responsabilização do agente, sendo dependente a responsabilidade à realidade fática do gestor e os obstáculos por ele enfrentados.

Da mesma forma, determina critérios para a aplicação das sanções: (i) natureza e gravidade da infração cometida; (ii) danos causados à Administração Pública; (iii) agravantes; (iv) atenuantes e (v) antecedentes.

A lei prevê também que na eventual revisão dos atos, contratos, ajustes, processo, ou ainda, havendo norma administrativa cuja produção já tiver sido completada, dever-se-á levar em conta as orientações da época, sendo vedado, após mudança da orientação geral, haver declaração de invalidade das situações plenamente constituídas.

A par das discussões sobre a indeterminação de alguns conceitos trazidos pela nova lei, ou ainda, se devem prevalecer as situações jurídicas perfeitas, de modo geral acreditamos que a lei tenha vários aspectos positivos até mesmo porque ela prevê um período de transição, se for o caso, às novas interpretações e orientações, sendo o intuito do legislador claramente tentar fazer que o mesmo Estado executivo, regulador, controlador ou judicante atue coerentemente, aproximando-se à juridicidade no sentido do mais razoável, proporcional e justo.

 

[1] Art. 20, parágrafo único da Lei n. 13.655, de 25 de abril de 2018. A motivação demonstrará a necessidade e a adequação da medida imposta ou da invalidação do ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa, inclusive em faze das possíveis alternativas

 

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