Mais de seis em cada dez profissionais dos 62.309 registrados na OAB com até 25 anos são mulheres. Na faixa etária mais sênior, entre 26 a 49 anos, 54% dos 466.452 advogados são do sexo feminino. Nos bancos das faculdades de Direito, a proporção se mantém: 55% do total de alunos matriculados são mulheres.
Mas pesquisas apontam que enquanto as mulheres são maioria nos escritórios, apenas 30% chegam a sócias. A pesquisadora Patrícia Bertolin, autora do livro “Mulheres advogadas: perfis masculinos de carreira ou teto de vidro”, aborda a dificuldade em conciliar carreira e maternidade. Há pesquisas que apontam também quanto se abre mão da vida pessoal em benefício da carreira. Nós conversamos com a psicóloga Fernanda Martins Ribeiro da Costa, coordenadora no Zenklub – plataforma de terapia online, que avalia: “Isso não acontece apenas no direito. É recorrente com mulheres em todas as profissões”. Confira:
- Você acredita que os desafios profissionais que as mulheres enfrentam para subir na carreira são os mesmos em qualquer profissão, não só no direito? Por quê?
É fato que as mulheres, no geral, têm maiores desafios para subir na carreira que os homens e acredito que isso independa da profissão. Vivemos sob influência da cultura patriarcal onde, por muito tempo, os homens ocuparam os postos de trabalho enquanto as mulheres cuidavam do lar e da educação dos seus filhos. E, embora os últimos anos tenham sido bem significativos quanto à garantia de direitos da mulher e sua ocupação no mercado de trabalho, ainda vemos poucas mulheres em posições executivas, seja em escritórios de direito, seja em empresas. E dentre as que chegam lá, percebemos que muitas acabam se “masculinizando”, por entender que características como a sensibilidade, intuição, empatia, são vistas como fraqueza e como sinal de incapacidade para liderar.
- De que forma é possível superar essas barreiras e crescer profissionalmente?
Acredito que o primeiro passo é reconhecer essas forças inconscientes que influenciam tanto nossas decisões e nossa percepção de nós mesmas. Por conta dos estereótipos sociais, muitas vezes inconscientemente nos sentimos menos capazes. Isso precisa ser identificado e reconhecido para que possa ser neutralizado ou, ao menos, minimizado. Outro ponto é tentar crescer profissionalmente sendo você mesma, por suas características e pontos fortes que fazem de você uma profissional única, sem tentar se adaptar a um perfil, suprimindo parte de quem você é.
- Na profissão do direito, há uma cobrança maior das mulheres?
Acredito que em todas as profissões isso exista. No direito, por ser uma profissão mais tradicional, talvez isso fique mais evidente.
- Você acredita que conciliar profissão e maternidade torna a situação mais desafiadora? Por quê?
Não há dúvidas de que a chegada de um filho torna a situação muito mais desafiadora. Ela tem que conciliar as necessidades do filho com todas as outras atividades que já assumia antes. Os pais estão cada vez mais presentes e participativos, mas a carga maior continua sendo da mãe. Isso faz com que muitas mulheres acabem sentindo que precisam optar por uma coisa ou outra: ter uma carreira brilhante ou ser mãe. É necessário que o ambiente corporativo respeite e estimule as diferenças.
- De que forma é possível virar esse jogo e continuar a crescer na carreira?
O jogo já começou a se equilibrar. Temos uma longa caminhada pela frente, mas as empresas estão percebendo como essa desigualdade é prejudicial não só para as mulheres, mas também para os homens (que tem a pressão de serem os provedores e acabam tendo limitação para exercer seus outros papéis), para os negócios e para a sociedade. As organizações estão cada vez mais preocupadas com esse fator, medindo a equidade e buscando ações afirmativas. Acredito que o início sempre passa pela conscientização, ou seja, por perceber que fatores inconscientes estão influenciando nossos julgamentos e, consequentemente, nossas decisões. E cabe a cada uma de nós, mulheres, influenciar nessa mudança através do debate e de cobranças por condições justas e igualitárias.