O Supremo Tribunal Federal concluiu, em 01/12/2023, o julgamento virtual do Recurso Extraordinário nº. 833291, de relatoria do Exmo. Ministro Dias Toffoli, apreciando o tema nº. 1.051 da repercussão geral. Por maioria de votos, o plenário declarou a inconstitucionalidade das Leis do Município de São Paulo nº. 10.947/1991 e nº. 11.649/1994, bem como, por arrastamento, do Decreto Municipal nº. 29.728/1991. Ficaram vencidos os Exmos. Ministros Edson Fachin, Cristiano Zanin, Alexandre de Moraes e Cármen Lúcia.
O Recurso Extraordinário que deu ensejo à tese consolidada foi interposto pela Associação Brasileira de Shopping Centers – ABRACE em face de acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que, por sua vez, havia julgado improcedente a ação direta de inconstitucionalidade proposta pela recorrente.
Destoando do entendimento adotado pelo Tribunal Paulista, o Pretório Excelso formou entendimento majoritário pelo provimento ao Recurso Extraordinário, reconhecendo, então, a inconstitucionalidade da legislação municipal paulistana.
A Lei Municipal nº. 10.947/1991, ora declarada inconstitucional, impôs, em seu artigo 1º, a implantação de ambulatório médico de serviços de pronto socorro nos shopping centers existentes na cidade de São Paulo, concedendo aos estabelecimentos o prazo de 180 dias para adequação. Já em relação aos shoppings construídos após a vigência da lei, a concessão do auto de conclusão e alvará de funcionamento estava condicionada à existência das instalações voltadas a atendimentos emergenciais.
A Lei Municipal nº. 11.649/1994, igualmente declarada inconstitucional, alterou o artigo 1º da Lei Municipal nº. 10.947/1991, passando a exigir também a presença de pelo menos um médico e uma ambulância nesses estabelecimentos. O Decreto Municipal nº. 29.728/1991, que seguiu a mesma sorte da legislação correlata, estabelecia os critérios a serem observados pelos shopping centers para a instalação desses ambulatórios médicos ou serviço de pronto-socorro.
Segundo o voto do Relator, Ministro Dias Toffoli, ainda que seja permitido que os municípios, no exercício da competência suplementar, legislem sobre proteção e defesa da saúde, desde que haja interesse local, conforme artigo 24, XII e artigo 30, I e II, da Constituição Federal; sem desconsiderar, igualmente, que, no que concerne à saúde, a Carta Magna prevê, em seu artigo 23, II, a competência administrativa comum entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios para cuidar da saúde e da assistência pública, as leis tratadas padecem de inconstitucionalidade material, eis que contrárias ao princípio da livre iniciativa, da razoabilidade e da proporcionalidade.
O Relator acolheu, ainda, o parecer da Procuradoria-Geral da República, na linha de que “as normas municipais impugnadas adentraram na seara do direito do trabalho e do direito comercial, ao obrigarem os shopping centers a manterem serviço de atendimento de emergência com a exigência de contratação de profissional médico.”
O Ministro também destacou o entendimento já firmado anteriormente pela Corte através do tema nº. 525, no sentido de que as leis municipais que exigiam a contratação de empacotadores pelos supermercados são inconstitucionais, por invadirem a competência da União para legislar sobre direito do trabalho e comercial, adotando a mesma lógica no julgamento aqui tratado.
Destacou o Relator, por fim, que “tais obrigações transbordam os limites de intervenção estatal na atividade econômica desenvolvida por esses estabelecimentos, seja pela ausência de correlação com a prestação de serviços oferecida, seja pela imposição de altos custos na implantação e manutenção do espaço, incluindo gastos com contratação, afora o custo de oportunidade de utilização do espaço.”
O julgamento, dotado de repercussão geral, certamente obstará iniciativas legislativas de outros municípios, não apenas no que concerne a shopping centers, mas também a outros estabelecimentos comerciais que não prestem serviço de saúde, como, por exemplo, supermercados.
A tese para o tema nº. 1.051 da repercussão geral foi assim delimitada: “É inconstitucional lei municipal que estabelece a obrigação da implantação, nos shopping centers, de ambulatório médico ou serviço de pronto-socorro equipado para o atendimento de emergência.”
Por Jessika Caparroz, advogada do Mendonça de Barros Advogados.