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TERCERIZAÇÃO: SEGUNDO O STF, AGORA, TUDO PODE? NÃO É BEM ASSIM.

No último dia 30 de agosto, no julgamento do RE 958252 e por 7 (sete) votos a 4 (quatro), o Supremo Tribunal Federal concluiu para licitude da terceirização de quaisquer serviços, mesmo antes do advento da Lei n. 13.429 de 31 de março de 2017, que alterou a redação da Lei n. 6.019/74 e ampliou sensivelmente a possibilidade de se adotar a terceirização pelas empresas brasileiras.

Embora ainda não se tenha a redação completa do voto relator – que recomenda-se aguardar para uma análise profunda e assertiva das implicações desse julgamento –, a tese de repercussão geral aprovada pelo STF foi a seguinte:

“É licita a terceirização ou qualquer outra forma de divisão do trabalho entre pessoas jurídicas distintas, independentemente do objeto social das empresas envolvidas, mantida a responsabilidade subsidiária da empresa contratante”

Em outras palavras, a principal modificação trazida pela tese de repercussão geral é o reconhecimento de previsão já constante do artigo 4º., da atual redação da Lei 6.019/74, também para situações pretéritas, qual seja: a possibilidade de terceirizar qualquer atividade da empresa, mesmo quando tratar-se das denominadas atividades-fim (atividades principais as quais se dedicam essas empresas), até então proibidas pelo entendimento consagrado na súmula n. 331, do Tribunal Superior do Trabalho.

Essa sinalização, a propósito, leva a crer que os próprios termos da nova redação da Lei n. 6.019/74 devam prevalecer, quando do julgamento de outros questionamentos similares que visam invalidá-la.

Mas nem por isso tal situação implica em reconhecer a tão festejada possibilidade de “terceirização irrestrita”, recentemente propagada, em especial no sentido de não haver possibilidade de que se reconheça o vínculo de emprego diretamente com o tomador dos serviços, se presentes seus requisitos na relação.

Em verdade, o grande feito da decisão do STF, ao menos até que se tenha ciência do completo fundamento que o embasou, foi retirar uma primeira barreira ao reconhecimento de uma terceirização lícita, relacionada à possível atividade a ser terceirizada (em geral, considerava-se ilícita a terceirização de atividades-fim).

Permanece, porém, o segundo e mais importante requisito para que a terceirização possa configurar-se regular: que a atividade desempenhada pelos trabalhadores da prestadora de serviços não se revista dos requisitos do liame empregatício em relação ao tomador.

Vale, com isso então, abordar algumas importantes questões que podem surgir a partir dessa decisão:

Segundo a tese de repercussão geral da decisão do STF, quais serviços podem ser terceirizados?

Virtualmente, qualquer serviço lícito desejado pela tomadora dos serviços poderá ser terceirizado.

Qualquer empresa poderá figurar como prestadora de serviços?

A tese deflagrada não é clara quanto à questão, mas para novas contratações, a Lei 6.019/74 já prevê que qualquer empresa poderá figurar como prestadora de serviços, desde que possua: (a) inscrição no CNPJ; (b) registro na Junta Comercial; (c) capital social compatível com o número de empregados – variável entre R$ 10.000,00 e R$ 250.000,00 (art. 4o -B, §1o).

Há requisitos para a formalização do contrato?

Nenhum explícito, mas nas contratações posteriores à Lei 13.427/17 são necessários: (a) a qualificação das partes; (b) a especificação dos serviços a serem prestados; (c) o prazo para realizar o serviço, quando cabível; e (d) o valor (art. 5o –B).

Como deve ocorrer a relação entre as empresas – tomadora e prestadora de serviços – e o trabalhador terceirizado?

Adota-se, também aqui, as previsões da Lei 6.019/74, por acreditar que reflitam a melhor sistemática, até mesmo para situações pretéritas: a empresa prestadora dos serviços deverá contratar, remunerar e dirigir o trabalho de seus empregados (art. 4o, §1o), ainda que nas dependências da tomadora (art. 5o-A, §2o).

Em outras palavras, é imperioso que o trabalhador terceirizado permaneça subordinado à prestadora dos serviços e não a tomadora.

Além disso, o serviço contratado deverá ser determinado e específico (art. 5o-A) e o trabalhador não poderá ter a atividade desviada (art. 5o-A, §1o).

É possível a configuração de vínculo diretamente com a tomadora dos serviços?

Se observados os requisitos da contratação e as obrigações já citadas, a expectativa é que isso não ocorra.

Porém, desrespeitadas quaisquer das previsões acima, ou acaso existentes os requisitos do vínculo de emprego entre a tomadora dos serviços e os empregados ou subcontratados da prestadora, a resposta é afirmativa.

A tomadora será responsabilizada pelos débitos trabalhistas dos empregados da prestadora dos serviços?

Sim. A responsabilidade dos tomadores de serviços pelas obrigações trabalhistas dos empregados das empresas prestadoras de serviços, nas terceirizações regulares, é reconhecida (pela tese e agora também por lei) como subsidiária.

 

Ponderações Preliminares

Ante a redação da tese de repercussão geral, embora seja possível prever uma maior tranquilidade quanto às atividades passíveis de terceirização, parece não haver grande alteração quanto aos demais cuidados necessários para o desenvolvimento de uma terceirização lícita.

Dentre eles, podemos citar como maior garantir que não coexistam, entre os trabalhadores (contratados) da empresa prestadora de serviços e a empresa tomadora desses serviços os requisitos de uma relação de emprego, quais sejam, (a) onerosidade, (b) pessoalidade, (c) habitualidade e, em especial, (d) subordinação jurídica.

De um ponto de vista prático, a falha em evitar a coexistência desses requisitos, em especial a subordinação, permanecerá gerando os mesmos riscos trabalhistas que até então resultaram das terceirizações de atividades meio (reconhecimento de vínculo de emprego, dentre outros), em ações individuais, coletivas ou mesmo fiscalizações, de modo que recomenda-se manter extrema cautela quanto a esses pontos.

Outra questão importante diz respeito à análise frequente da saúde financeira das empresas contratadas, pois caso seja falha, mesmo a responsabilidade subsidiária eventualmente reconhecida pode tornar-se, na prática, direta.

De todo o modo, para uma definição mais apropriada de todos os pontos acima, considera-se importante aguardar a publicação do voto relator.

Walter Abrahão Nimir Junior – sócio de Zeigler e Mendonça de Barros Sociedade de Advogados

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