A eventual concessão de auxílio-doença ao empregado, pela autarquia previdenciária, produz alguma consequência em seu direito a férias?
Antes que se pretenda ou possa responder a esse questionamento, é salutar conceituar os dois institutos e algumas de suas particularidades, ainda que de maneira breve.
Para essa tarefa, elegeu-se como conceito mais apropriado para as Férias (previstas nos artigos 129 e seguintes, da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT), aquele extraído das lições do emérito Orlando Gomes.
Sob a ótica daquele autor, as Férias são um direito do empregado, de interromper o trabalho, por iniciativa do empregador, durante um período viável, a cada ano, sem perda da remuneração, cumpridas certas condições de tempo no ano anterior, a fim de atender aos deveres da restauração orgânica e de vida social.
Pode-se dizer que o direito do empregado às férias é regulado por cinco princípios básicos, adiante resumidos: (i) anualidade, uma vez que todo empregado tem direito a férias anuais; (ii) remunerabilidade, porque durante as férias é assegurado o direito à remuneração integral, acrescida de um terço; (iii) continuidade, pois o fracionamento da duração das férias sofre limitações, ainda que mais branda após a reforma trabalhista; (iv) irrenunciabilidade, já que o empregado deve efetivamente gozar as férias, não podendo “vender” mais do que 10 (dez) dias; e (v) proporcionalidade, uma vez que a duração pode ser reduzida em função de ausências do empregado e porque o trabalhador fará jus ao pagamento proporcional dos períodos aquisitivos não completados na rescisão do contrato de trabalho.
Chama-se aquisitivo o período de doze meses necessário para que o empregado faça jus ao descanso e concessivo o intervalo dos doze meses subsequentes, em que ele deve ocorrer (artigo 130, da CLT).
Não as concedendo no prazo ou quitando-as as destempo, o empregador fica sujeito a uma sanção, qual seja, o pagamento em dobro do valor devido, além da concessão propriamente dita (artigo 137, da CLT, e Súmulas nºs 7, 81 e 450, do TST), que pode, inclusive, ser reclamada judicialmente.
A CLT faculta, ainda, ao empregado, converter 1/3 (um terço) do período de férias a que tiver direito em abono pecuniário, no valor da remuneração que lhe seria devida nos dias correspondentes, devendo o abono ser requerido até 15 (quinze) dias antes do término do período aquisitivo (artigo 143, da CLT).
A duração das férias depende da assiduidade do empregado, sofrendo diminuição na proporção das suas faltas injustificadas (artigos 130 e 131, da CLT e Súmulas nºs 46 e 89, do TST).
O descanso do empregado durante as férias é obrigatório, de modo que, durante as férias, está legalmente proibido até mesmo de prestar serviços a outro empregador, salvo se estiver obrigado a fazê-lo em virtude de contrato de trabalho regularmente mantido com aquele (artigo 138, da CLT).
Cabe ao empregador assegurar esse descanso, seja recolhendo seus instrumentos de trabalho, seja utilizando-se do poder disciplinar.
Caso o empregado não observe a determinação para gozo de férias, poderá ser advertido, suspenso e, em caso de reincidência reiterada, até dispensado por justa causa do emprego, por ato de insubordinação. É imperioso, para tanto, que não seja dele exigido qualquer serviço no período.
O auxílio-doença, a seu turno, pode ser qualificado como um benefício previdenciário quitado aos trabalhadores pela Seguridade Social. No caso de empregados, é devido quanto estes se afastam do trabalho, por prazo superior ao previsto em lei (normalmente 15 dias consecutivos), em razão de doença ou acidente.
Nesse interregno, o contrato de trabalho do empregado permanece com os seus efeitos suspensos, já que não há obrigação de trabalho, por parte do empregado, nem de pagamento de salários, pelo empregador.
Pois bem. Ultrapassada essa questão conceitual dos institutos, é imperioso destacar que, segundo previsão expressa do artigo 133, inciso IV, da CLT, Não terá direito a férias o empregado que, no curso do período aquisitivo (…) tiver percebido da Previdência Social prestações de acidente de trabalho ou de auxílio-doença por mais de 6 (seis) meses, embora descontínuos.
Em outras palavras, qualquer empregado que, dentro de um mesmo período aquisitivo receber, ainda de maneira descontínua, prestações de auxílio doença, por mais de seis meses, perderá, ou melhor, não fará jus ao direito as férias proporcionais daquele período aquisitivo específico.
Nessa hipótese, um novo período aquisitivo passará a ser computado, apenas, a partir do retorno do trabalhador a empresa. Essa é a previsão do §2º, do mesmo dispositivo legal.
Há que se notar, porém, que as férias passíveis de “não aquisição” são apenas as proporcionais. Eventuais férias vencidas permanecem devidas, posto tratar-se de direito adquirido do trabalhador.
No entanto, a obrigação de concedê-las ficará suspensa pelo tempo que durar o afastamento do trabalhador, por conta do quanto determinado pelo artigo 476, da CLT, bem como 63, da Lei 8.213/91.
Como se vê, embora de conceito simples, faz-se necessária alguma atenção para aferição das efetivas consequências sobre as férias, de afastamentos com a percepção de auxílio doença. Espera-se, portanto, que este texto possa ser um breve guia para assistência ao leitor nessas situações.
Walter Nimir – Sócio Trabalhista do ZMB Advogados