Atualmente, o Brasil é considerado um dos países com maior número de empreendedores do mundo. Pesquisas apontam que cerca de 52 milhões de brasileiros detêm negócios próprios. Empreender, entretanto, não é tarefa de baixo custo e se apresenta como enorme desafio, haja vista a recorrentes pesquisas que apontam que cerca de uma em cada cinco empresas fecham as portas em menos de um ano em operação e a maioria delas não sobrevive a um período de cinco anos.
O país possui, também, uma quantidade crescente de Redes de Franquia, com acréscimo de 2.771 operações de franchising no País, apenas tendo no primeiro trimestre de 2022, totalizado 173.770 unidades, com 1.417.529 trabalhadores registrados. Mas afinal, qual a definição legal do Sistema de Franquia?
O art. 1º, da Lei nº 13.966, de 26 de Dezembro de 2019, esclarece que trata-se de um sistema no qual um Franqueador autoriza, por meio de contrato, um Franqueado a usar suas marcas e outros objetos de propriedade intelectual, sempre associados ao direito de produção ou distribuição exclusiva ou não exclusiva de produtos ou serviços e, também, ao direito de uso de métodos e sistemas de implantação e administração de negócio ou sistema operacional desenvolvido ou detido pelo Franqueador, mediante remuneração direta ou indireta, sem caracterizar relação de consumo ou vínculo empregatício em relação ao Franqueado ou a seus empregados, ainda que durante o período de treinamento.
De modo simplificado, temos, portanto, duas importantes figuras na relação: (i) a do Franqueador, que corresponde ao “dono” da marca, fornecendo sua marca, seu know-how e seus produtos, e (ii) a do Franqueado, entendido como a parte que irá utilizar a marca, a sistemática e os produtos que que o Franqueador oferece.
Apesar desta proximidade, o mesmo artigo apresentado acima deixa clara uma situação: não se caracteriza relação de consumo ou vínculo empregatício do Franqueador em relação ao Franqueado ou a seus empregados.
Ou seja, trata-se de mera relação empresarial entre as partes, as quais são dotadas de autonomia, objetos sociais próprios e que não integram um grupo econômico, não ocorrendo a prestação de serviços pelos empregados das Franqueadas à Franqueadora.
Nota-se, portanto, que, como regra, não se caracteriza relação de emprego entre o empregado ou preposto da empresa Franqueada e a Franqueadora.
Ainda sobre o tema, de acordo com a jurisprudência do TST, “a existência de contrato de franquia não transfere à empresa Franqueadora a responsabilidade subsidiária pelas obrigações trabalhistas descumpridas pela franqueada […].”
Então, em casos de demandas trabalhistas, o Franqueador sempre está “seguro”?
A resposta é NEGATIVA!
Isto, porque, empiricamente, a relação entre Franqueador e Franqueado é autônoma, porém, na prática, isto nem sempre é observado. Baseando-se em Princípios como o da verdade real, o ordenamento jurídico brasileiro relativiza a autonomia do Franqueador, caso seja apresentado um desvio de função do contrato de franquia.
Esse desvio de função contratual pode ser observado ao se formalizar a franquia com o intuito de “ocultar” seu real objetivo ou mesmo pela prática de ato, ainda que sem tal intenção, que, na prática, desvirtuem a relação. Isto ocorre, por exemplo, com a finalidade de constituir um Grupo Econômico, que pode ser definido como empresas que mesmo possuindo personalidade jurídica própria, estiverem sob a controle ou administração de outra.
Outro fato comum é a utilização do Contrato de Franquia para mascarar uma relação de prestação de serviços (terceirização), regulada atualmente em Lei própria (Lei 6.019/74, alterada pela responsabilidade subsidiária – o devedor subsidiário é cobrado caso o principal seja inadimplente – ao tomador dos serviços. Nessa hipótese, portanto, o Franqueador pode vir a ser responsabilizado subsidiariamente em relação a verbas devidas aos empregados do Franqueado.
Se reconhecida fraude na relação ou mesmo caso caracterizado Grupo Econômico entre Franqueador e Franqueado, a responsabilização das empresas pode ser considerada solidária – sem ordem de preferência na cobrança.
Ainda, para além dos casos de responsabilização solidária ou subsidiária acima, em situações mais extremas, pode ser reconhecido até mesmo o vínculo de emprego de empregados da Franqueada com a Franqueadora, declarando-se a nulidade da contratação pela Franqueada.
Conclui-se o presente texto de modo a apontar que de fato, coerente é o entendimento acerca da separação de responsabilidade trabalhista entre Franqueadora e Franqueada, salvo quando este instituto seja utilizado, consciente ou inconscientemente, com o fito de burlar a lei.