Por Walter Abrahão Nimir Jr.
Embora não seja expediente novo para boa parte das empresas, a concessão de veículos a empregados ainda gera recorrentes dúvidas acerca do tratamento jurídico adequado a ser outorgado ao benefício.
Nossos tribunais já pacificaram o entendimento a ser adotado, mas ante a possibilidade de abordagem divergente, a depender de detalhes de interpretação nem sempre tão objetivos para as empresas, remanescem algumas dúvidas que vale à pena tentar dirimir.
Quando o veículo integra o salário?
O artigo 458, da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, prevê que “além do pagamento em dinheiro, compreendem-se no salário, para todos os efeitos legais, a alimentação, a habitação, vestuário ou outras prestações ‘in natura’ que a empresa, por força do contrato ou do costume, fornecer habitualmente ao empregado.”. O parágrafo 2º, inciso I, do mesmo dispositivo, exclui as utilidades fornecidas aos empregados para a prestação dos serviços da integração salarial.
Daí decorre a clássica distinção doutrinária das verbas e utilidades concedidas aos empregados, qual seja, as verbas e utilidades ofertadas como contraprestação do trabalho integram a remuneração para todos os efeitos, o que não ocorre com aquelas fornecidas para execução dos serviços.
Com isso, qualquer utilidade fornecida ao empregado apenas para que lhe seja possível desempenhar suas tarefas não é considerada salário, não integrando a base de cálculo do 13º salário, das férias, das horas extras, do fundo de garantia do tempo de serviço (FGTS), das contribuições previdenciárias (INSS) etc.
Especificamente quanto aos veículos fornecidos, desde que utilizados pelos empregados, ao menos em parte, para o desempenho dos serviços, consolidou-se o entendimento de que não se configuram como salário utilidade.
Referido entendimento encontra-se pacificado pelo Tribunal Superior do Trabalho, através da Súmula nº 367, que assim prevê:
“UTILIDADES “IN NATURA”. HABITAÇÃO. ENERGIA ELÉTRICA. VEÍCULO. CIGARRO. NÃO INTEGRAÇÃO AO SALÁRIO (conversão das Orientações Jurisprudenciais nºs 24, 131 e 246 da SBDI-1) – Res. 129/2005, DJ 20, 22 e 25.04.2005
I – A habitação, a energia elétrica e veículo fornecidos pelo empregador ao empregado, quando indispensáveis para a realização do trabalho, não têm natureza salarial, ainda que, no caso de veículo, seja ele utilizado pelo empregado também em atividades particulares. (ex-Ojs da SBDI-1 nºs 131 – inserida em 20.04.1998 e ratificada pelo Tribunal Pleno em 07.12.2000 – e 246 – inserida em 20.06.2001) (…)” (grifamos)
O problema interpretativo ocorre, no entanto, em quando qualificar o veículo como “indispensável para a realização do trabalho”.
Para um vendedor externo que recebe o automóvel, tal conceituação parece ser simples.
E para o gerente da empresa que faz visitas externas? Parece bastante claro também, não é?
E para aquele que, embora não faça tais visitas, precisa deslocar-se entre duas instalações diferentes da empresa? E, caso se considere como não salarial para algum dos anteriores, será salarial para o que não precisa realizar deslocamentos?
E no caso de diretores? A “representação” da empresa em reuniões, almoços, jantares etc. justificaria o veículo como indispensável ao deslocamento?
A verdade, infelizmente, é que trata-se, em muitos casos, de uma questão bastante interpretativa, pelo que deverá ser analisada caso a caso para melhor resguardo do empregador.
Qual valor deve integrar o salário?
No caso do benefício ter reconhecido seu caráter salarial, outra dúvida muito comum é: qual valor deve integrar o salário do trabalhador?
Neste aspecto, há decisões para todos os gostos e pretensões, mas as que parecem melhor observar o espírito legal são as que consideram a depreciação do veículo no período que o empregado dele fruiu.
Ou seja, quando entregue ao empregado um veículo de R$ 50.000,00 e este retorna à empresa com valor de mercado de R$ 40.000,00, o mais adequado seria a utilização dessa diferença (R$ 10.000,00) para integração ao salário do trabalhador.
Ocorre que, a jurisprudência mais frequente costuma determinar a observância da média do aluguel de veículos semelhantes no interregno. O problema, no entanto, é que essa medida incorpora, além do valor depreciado do bem em si, impostos, custos, despesas e lucros da locadora de veículos, que certamente não representam benefício nenhum ao trabalhador.
Não obstante, é importante ter em mente que o aluguel, ainda que tecnicamente não seja a melhor medida a ser adotada, permanece sendo a mais frequente na Justiça do Trabalho.
Espera-se, com os esclarecimentos acima, trazer um direcionamento mais adequado aos gestores, quando da concessão de veículos aos empregados da empresa, cabendo recomendar a plena observância daqueles que isentam as empresas da integração dos veículos aos salários, caso assim desejem proceder.