Comercial, Publicações Gerais por MB Advogados

Perspectivas para o comércio internacional brasileiro no atual cenário

por Maria Carolina Mendonça de Barros

Com os embargos sofridos pela carne brasileira em diversos mercados relevantes para o País, por ocasião da operação Carne Fraca, muito se falou sobre a enorme importância do agronegócio para o Brasil e sua relevância na pauta da exportação brasileira. De fato, a pauta de exportação brasileira desse setor impressiona: o Brasil é hoje o maior exportador mundial de soja, café, açúcar e suco de laranja, além de carne bovina e de frango; bem como o segundo maior exportador mundial de milho.

A despeito dos reveses, o Brasil tem espaço para aumentar suas trocas comerciais com vários mercados. Nos últimos anos o País adotou uma política mais protecionista de mercado, explicitada no projeto de política comercial descrita no Plano Brasil Maior da ex-presidente Dilma Rousseff. De acordo com a visão da ex-presidente, o Brasil precisava fortalecer sua estratégia de defesa comercial – tanto assim que fez crescer o Decom – Departamento de Defesa Comercial – contratando diversos profissionais para atuarem nas investigações de práticas comerciais consideradas desleais, reinvindicação constante especialmente do setor industrial do País. Além disso, reforçou a ligação entre ideologia política e comércio, assinando entre 2004 e 2016 acordos com o Suriname, a Venezuela e o Peru; além de, como membro do Mercosul, acordos com Cuba, Índia, Israel, SACU (União Aduaneira formada por África do Sul, Namíbia, Botsuana, Lesoto e Suazilândia), além de Egito e Palestina (os dois últimos ainda sem vigência).[2]

Já o novo governo tem procurado recolocar o Brasil como participante importante no cenário internacional, deixando ideologias de lado e focando na expansão de novos negócios e na ampliação da participação em mercados e acordos comerciais mais relevantes, como o acordo Mercosul-União Europeia, além de uma maior aproximação com o México, Estados Unidos e Argentina. Nesta política, fortaleceu a Camex, contratando profissionais com qualificação em várias carreiras, como analistas de regulação e comércio exterior. Também a Secretaria Executiva realizou um estudo da política de defesa comercial vigente e, com base nisso, decidiu por solicitar que seja realizada a análise do interesse público em caso de solicitação de prorrogação de um direito antidumping. Esse posicionamento está em linha com uma visão mais moderna do instituto, pela qual é necessário levar em consideração o custo para os consumidores e para o país com a manutenção de um direito antidumping sobre um produto importado, não obstante seja sempre de interesse da indústria nacional a continuidade da proteção.

Aliado à disposição do governo em dinamizar o comércio internacional, outros fatores podem beneficiar o Brasil no campo comercial: a eleição de Donald Trump, por exemplo, pode abrir várias e importantes oportunidades para o País, que deve ser rápido para aproveitá-las.

Trump elegeu-se com um discurso bastante protecionista e contrário a diversos acordos comerciais dos quais os EUA participam, como o Nafta e a Parceria Transpacífico (TTP)[3]. Nessa linha, assinou recentemente decreto que determina que o Departamento do Comércio dos EUA elabore, no prazo de 90 dias, amplo relatório do comércio internacional americano, produto por produto, para identificar relações nas quais os EUA sejam deficitários ou sofram práticas desleais de comércio. Ao mesmo tempo, editou medida que beneficia a antiga indústria do carvão americana e informou que se retiraria dos acordos sobre o clima e a consequente meta de redução de emissão de gases ratificada pelo governo Obama.

Ao retirar-se do Transpacífico, os EUA rompem com a lógica do governo anterior, que era de se fortalecer economicamente naquela região, diminuindo o poder da China no continente. Trump elegeu-se com um discurso duro contra o que chamou de hegemonia chinesa, mas parece que não se atentou para o fato que, ao escolher o TTP como inimigo dos interesses americanos, fez justamente o que a China gostaria, ou seja, permitiu que essa continuasse a aumentar sua influência na região, enfraquecendo o Japão, aliado dos EUA e dele dependente, inclusive militarmente. Tanto é verdade que a Casa Branca recentemente abrandou o discurso sobre o acordo e tratou de tranquilizar o Japão sobre sua presença militar no país. Também os duros discursos relativos aos imigrantes mexicanos e intenção de renegociar os termos da Alca para favorecer os interesses norte-americanos causou mal-estar entre os países, importantes mercados recíprocos.

As tensões causadas pelo presidente norte americano podem acarretar ganhos comerciais para o Brasil, se esse souber aproveitar os espaços deixados pelos EUA. O México, por exemplo, passou a ter interesse em buscar maior independência comercial dos EUA explorando novos fornecedores e, assim, protegendo-se das ameaças norte-americanas. O México importa hoje 80% dos produtos agrícolas que consome dos EUA, sendo o terceiro maior importador de soja do mundo, o segundo em milho e terceiro em carne suína e já explicitou que a Argentina e o Brasil são os mercados com os quais está interessado em fortalecer relações comerciais. Para o Brasil interessa muito novos parceiros comerciais para, assim, passar a ter menos dependência da China.

Da mesma forma, com a retirada dos EUA do TTP, o Brasil se livra de dois riscos: desvio do comércio, pois, em caso de aprovação, os parceiros acabariam por privilegiar reciprocamente seus produtos em detrimento de produtos brasileiros, bem como desvio de investimento, pois a cooperação regulatória e harmonização de normas facilitam os investimentos entre os países que participam do acordo, prejudicando países como o Brasil que ficaram de fora da negociação. O Brasil ganhou tempo para assinar novos tratados, recuperando anos perdidos e evitando, assim, ficar de fora da nova estrutura do comércio mundial, como vinha ocorrendo.

A União Europeia também passou a ser um mercado relevante para o Brasil. A saída do Reino Unido da comunidade trouxe tensões para a região e estimulou o interesse da União Europeia em buscar novos parceiros comerciais, entre eles o Mercosul, cujo acordo tem estado em banho-maria, por não ser prioridade na pauta dos governos anteriores. O Brasil já é o mercado sul-americano de maior relevância para a Espanha, que junto com Portugal pode ser a porta de entrada para a intensificação do comércio com a Europa. No último dia 31 de março, o ministro de Economia e Finanças da França, Michel Sapin, reuniu-se no Brasil com o Ministro da Indústria, Comércio Exterior e Serviços, Marcos Pereira, demonstrando seu apoio no avanço das negociações entre Mercosul e União Europeia, com o objetivo de concluí-lo em 2018. Segundo o ministro francês, num momento em que países passam a adotar um viés mais protecionista nas políticas comerciais, formalizar o acordo se faz ainda mais necessário.

Por fim, no âmbito bilateral, a boa notícia foi a entrada em vigor, em 22 de fevereiro último, do Tratado de Facilitação ao Comércio, ratificado por 2/3 dos países membros, incluindo o Brasil. Em meio a todas as dificuldades atuais enfrentadas pela OMC, a aprovação desse tratado é uma ótima notícia. O objetivo central do acordo é promover a desburocratização das trocas comerciais e, consequente, seu barateamento, de maneira a incentivar o aumento das vendas internacionais. Especialistas preveem que o custo do comércio poderá ser reduzido em média 14,3%, aumentando as trocas globais em até U$ 1 trilhão por ano. Em consonância, o governo inaugurou o Portal Único de Comércio Exterior, iniciativa para desburocratizar os processos de comércio exterior brasileiro.[4]

Todos esses componentes podem abrir ao Brasil uma janela de oportunidades que não deve ser desprezada. A melhora dos números na economia e da confiança no País, ainda que discreta, auxilia nessa empreitada para que o Brasil volte a ser um país relevante no cenário internacional. O aumento do comércio global, juntamente com as reformas estruturais que o País vem tentando instituir (reforma trabalhista, da previdência, teto de gastos públicos, entre outras), certamente terá um papel fundamental na retomada do crescimento econômico.

[1] USDA
[2] Fonte: http://www.mdic.gov.br/comercio-exterior/negociacoes-internacionais/796-negociacoes-internacionais-2

[3] Japão, Austrália, Canadá, México, Peru, Chile, Malásia, Vietnã, Nova Zelândia, Cingapura e Brunei.
[4] Fonte: www.mdic.gov.br
[/fusion_builder_column][/fusion_builder_row][/fusion_builder_container]

Matérias Relacionadas

Pular para o conteúdo