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Correção de ofício do valor da causa não admite agravo de instrumento, decide STJ

Em recente julgamento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça reafirmou o entendimento de que a decisão interlocutória que corrige de ofício o valor da causa não admite agravo de instrumento. A tese foi fixada no REsp 2.186.037/AM, de relatoria da Ministra Nancy Andrighi, julgado em 20 de março de 2025.

Segundo o colegiado, tal decisão não está prevista no rol taxativo do art. 1.015 do CPC, tampouco se enquadra na hipótese de urgência autorizadora da “taxatividade mitigada” (Tema 988/STJ). Nesses casos, o caminho processual adequado é o exame em sede de apelação, após a sentença.

O Tribunal também destacou que o juiz pode — e deve — corrigir o valor da causa de ofício nos termos do art. 292, §3º, do CPC, sempre que este não refletir o conteúdo econômico da demanda.

No ponto, o acórdão expressamente consignou:

“Eventual questionamento acerca do correto valor atribuído à causa poderá ser novamente examinado em sede de preliminar de apelação, com a devolução de eventual montante recolhido a maior por meio da via apropriada, bem como poderá ser pleiteada a concessão de gratuidade da justiça caso a parte autora não disponha de recursos suficientes para pagar as custas processuais sem prejuízo de sua subsistência (arts. 98 e 99 do CPC).”

 

Decisão técnica, mas que exige atenção prática dos litigantes:

 

A decisão do STJ é coerente com a sistemática recursal do Código de Processo Civil e com a lógica do Tema 988, que limita o agravo de instrumento a hipóteses expressamente previstas ou marcadas por urgência irreversível. Sob essa ótica, a alteração do valor da causa pode, em tese, ser reapreciada futuramente sem prejuízo processual imediato, o que afasta a excepcionalidade exigida.

No entanto, do ponto de vista prático, a decisão pode gerar ônus financeiros significativos ao longo do processo, especialmente em Estados, onde as custas recursais de apelação são calculadas com base no valor da causa — muitas vezes em percentual fixo e exigidas de forma imediata.

Em situações nas quais a parte atribui à causa um valor proporcional ao que entende devido, mas o juízo reformula esse valor para patamares muito superiores, surge um cenário de insegurança: a parte poderá ser compelida a recolher custas elevadas desde o início, mesmo que ao final se reconheça que o proveito econômico real era substancialmente menor.

Essa disparidade impacta diretamente o acesso à justiça e pode forçar o ajuizamento de ações com valores artificiais ou até mesmo inibir a propositura de demandas legítimas — especialmente em causas de natureza indenizatória ou estimativa patrimonial controversa.

Não obstante, a decisão reafirma uma diretriz importante do STJ: nem toda decisão interlocutória é passível de impugnação imediata, mesmo que traga reflexos práticos relevantes. No caso da correção de ofício do valor da causa, o caminho natural é a discussão em preliminar de apelação.

Por outro lado, cabe aos litigantes manter atenção redobrada aos impactos financeiros indiretos dessa sistemática, que pode exigir medidas preventivas, pedidos de tutela e até revisão de estratégias processuais para preservar o equilíbrio econômico da demanda e o próprio acesso à jurisdição.

 

Acórdão na íntegra: 

https://processo.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=202401922245&dt_publicacao=26/03/2025 

 

Por Isabela Betoni, advogada do Mendonça de Barros Advogados.

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